21/1/13
Entre correrias e buscas, que sentimento de perda é este, tão irreparável que nos faz vorazes por ganhos a qualquer custo, em todo tempo, independente do símbolo e do valor de cada situação? Parece que ninguém mais acredita que dar passagem ao motorista que deseja mudar de faixa, por exemplo, possa ser apenas uma gentileza e não uma perda. E nem chego a pensar em coisas mais relevantes, como as relações mais próximas, por enquanto.
Ao que parece, é como se todo gesto sem lucro fosse um prejuízo; perda de tempo, de dinheiro e daquilo que não se sabe o quê; é como se um sinal de esforço ou dedicação fosse uma troca injusta, quando não há retorno imediato, ou, no mínimo, na mesma proporção.
Mais do que dar exemplos - já pensei em vários, enquanto escrevo este texto... - o melhor é propor um olhar para o lado: o meu e o seu. Já fez isso? Então continue lendo... Será que esses exemplos que nos borbulharam foram motivados por injustiças sofridas ou será a busca por uma compensação, de uma necessidade maior? Será que fomos ou estamos sendo tão ludibriados, a ponto de nos colocarmos vigias constantes e implacáveis contra atos que, com outro olhar, seria apenas um exercício de boa vivência?
Que falta é essa, ou melhor, que necessidade de ganho constante é essa que nos faz sujeitos desenfreados pelas vantagens, e que tanto machuca quando algo não traz benefício?
Será que o lucro é sempre um lucro? Será que permitir-se a uma gentileza é perder oportunidade de ganhos, de um minuto a mais num caixa de supermercado, ajudar a um colega de trabalho, escutar um amigo? Dia desses, li: “o surdo é que não tem espaço para um amigo”. E a quem não se permite uma gentileza, que frase poderíamos criar? Será que estamos ficando surdos e cegos em meio à correria por oportunidades? Será irreal, fora de propósito parar para pensar em como estamos nos portando diante do outro, da vida? Será que é perder tempo, chances?
Quem sabe ceder em um momento oportuno, onde se pode fazer a diferença na vida das pessoas, não seja um exercício a uma convivência mais harmônica, e, principalmente, uma valoração de si mesmo, da própria tolerância? Quem sabe a nossa indignação por um erro no trânsito, passível a todos nós, não seja mais digna de longas e extensas buzinadas de reprovação, como se fôssemos inatingíveis pelos deslizes? Afinal, que falhas pessoais são essas que nos fazem projetar no outro essa insatisfação?
É claro que temos que ponderar essas relações. Afinal, as trocas são importantes. Fazendo isso, é só seguir. Não se fala aqui em submissão, mas numa proposta a olharmos para o que realmente nos incomoda; o que realmente nos torna leões vorazes das oportunidades, sem prejuízos, a qualquer custo.
Já que o mundo não acabou, que tal pensarmos nessa tal necessidade de ganho e falta de cumplicidade como, talvez, fugas de nós mesmos diante desse desenfreado e impositivo modo de vida?
Aleandro Rocha – psicanalista e jornalista
fallalivre@gmail.com